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domingo, maio 29, 2005

Os Inocentes 



Os Sonhadores
Título original: The Dreamers
Realização: Bernardo Bertolucci
Intérpretes: Michael Pitt, Eva Green, Louis Garrel, Anna Chancellor, Robin Renucci, Jean-Pierre Kalfon
Origem: EUA/França/Itália/Grã-Bretanha, 2003
Estreou em Portugal: 6 de Maio de 2004
www2.foxsearchlight.com/thedreamers/
Classificação: 4.0

[Só vi este filme ontem à noite graças à A Dois.]

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Eva Green.

> A cultura cinematográfica não tem, obrigatoriamente, que se basear unicamente em situações mais sensuais do que sexuais. Vários são os realizadores, muitos deles prestigiados, que se aproximam, por vezes, da pornografia nos seus filmes, como é o caso de The Dreamers.
Algumas vezes parece-me abuso e descaracteriza a história. Mas neste filme a nudez e actividades sexuais dos três jovens protagonistas está bem longe da superficialidade da pornografia. Os aspectos crus e nus de preconceitos que aparecem aqui são uma consequência inevitável da história introspectiva e de auto-descoberta destes três jovens.

Uma experiência tão intensa quanto intima e pessoal é o que podemos saborear neste filme de Bernardo Bertolucci, que cativa facilmente pelos mistérios partilhados entre um irmão e uma irmã siameses que facilmente se tornam amigos intimos de um jovem americano a estudar na Paris de 1968. A relação deste trio é constamente alimentada pelo seu gosto apaixonado pelo cinema clássico e também pela música. São constantes os jogos culturais que depressa se tornam em jogos sexuais, tal é também o sinal daqueles tempos. Amor, paixão, sexo, muita nudez, cultura cinematográfica e musical e excentricidades de jovens inteligentes e interessantes que levam mais além o seu aparente à vontade uns com os outros.


Uma reminiscência (em forma de jogo) cultural, agora com a escultura de Venus de Milo.

Apesar da intensidade dramática num plano muito intimo e pessoal das personagens este é também um filme de época. Estes três jovens são o reflexo do Maio de 68, da sociedade da altura – apesar das suas particularidades. É constante a presença da revolução estudantil no filme, em pequenas partes. Existem dois dominios primordiais: a esfera intima da casa e a esfera pública, essencialmente com o desenhar (construir) do Maio de 68 e das ideias políticas daí adjacentes. A esfera intima predomina, mas ambas interagem uma com a outra. Aliás, mesmo a nível cultural a presença de uma banda sonora adequada composta por Jimi Hendrix, Grateful Dead, Edith Piaf e o poeta dos extremos e mais presente do que os outros, Jim Morrison, dá à esfera intima maior expressão e significado nas relações que os três jovens estabelecem uns com os outros. As reminiscências com filmes antigos e respectivas miméticas são também uma constante, os protagonistas vivem, de certo modo, dentro dos clássicos que adoram.

Vivem numa pocilga, mas vivem felizes nos seus fetiches, incertezas e inspirações. Há conflitos e discussões, mas bom senso e muitas sensações. Os pormenores incutem maior significado nos jogos intencionais e ingénuos que as emoções dos jovens nos demonstram. A história retratada é convincente e interessante. Com nudez, sexo e tudo mais que pode chocar alguns no cinema, a verdade é que a vida é feita dessas coisas e aqui estamos perante influências de uma época e fetiches de juventude. As descobertas e inspirações de pessoas complexas e interessantes.

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Eva Green. A jovem, que faz de irmã siamesa de Theo, não só é linda como poucas, mas é uma excelente actriz. Este foi o filme de estreia desta jovem francesa/sueca de 24 anos – tinha vencido um prémio de teatro antes de fazer o filme – e começou com um filme tão audaz na forma como lida com o corpo. É curioso como o cinema tem preferência para consagrar por mulheres com personalidade e carácter, como é o caso de Eva Green e também de Scarlett Johansson. Ambas, embora jovens, demonstram uma grande maturidade e têm uma beleza que não é de top model, mas é mais genuina e, por isso, verosímil. Eva Green aparece no filme de Ridley Scott, Reino dos Céus. Um filme que é uma desilusão, mas onde a actriz francesa volta a mostrar grande maturidade ao interpretar uma mulher bem mais experiente na vida e com uma carga emocional complexa que convence. No filme de Ridley Scott, Eva contracena com o seu actor preferido (para mim também), Edward Norton. Não é só mais uma actriz muito bonita, como uma actriz completa e verdadeira. (ver aqui entrevista a Eva Green)

Michael Pitt. Aparece aqui como o jovem estudante americano em Paris que se envolve com os dois irmãos siameses de uma forma apaixonante e invulgar. Depois de ter aparecido na série Dawson´s Creek, Michael Pitt tem já uma carreira variada e com participações em filmes de realizadores de primeira água. Fez The Dreamers (2003) e, de seguida, Wonderland (2003). Participou ainda em The Village (2004) e protagoniza ainda o bióbico de Gus Van Sant sobre a vida de Kurt Cobain, Last Days (2005). Uma carreira interessante e promissora.
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Uma corrida pelo Louvre, mais uma remisniscência com um filme clássico - numa tentativa de bater um recorde de tempo -, numa das poucas vezes em que os jovens saem juntos de casa. É lá que se passa grande parte da acção.


O texto seguinte é do site Cinema 2000:
"Os jovens não sabem nada sobre 68. É como se tivesse existido uma grande censura e acho que isso é completamente de loucos. Porque mesmo que tenha sido um falhanço dos sonhos revolucionários, 68 foi incrivelmente importante para a mudança do comportamento das pessoas. Tudo mudou. Em Itália, asnpessoas costumavam ser multadas por se beijarem na rua! Os miúdos de hoje, que tomam a sua liberdade como certa, não sabem que muito disso foi conquistado em 68."

BERNARDO BERTOLUCCI

Trinta anos depois de «O Último Tango em Paris», Bernardo Bertolucci voltou a chocar algumas sensibilidades aquando da apresentação do seu último trabalho durante o 60.º Festival de Cinema de Veneza, em Agosto de 2003, onde esteve na secção competitiva: «Os Sonhadores» («The Dreamers»).

Deixados sozinhos em Paris enquanto os pais partem de férias, Isabelle (a estreante Eva Green) e o seu irmão gémeo Theo (Louis Garrel, filho do realizador francês Philippe Garrel) convidam um estudante, Matthew (Michael Pitt), um jovem americano, a ficar no seu apartamento. Mas nada é inocente e os seus destinos vão interligar-se a partir desse momento. O casal de gémeos quer iniciar a sua emancipação sexual, mas precisam de alguém que os ajude, e Michael acaba por ser usado como um inocente: Theo quer que ele o separe da sua irmã e Isabelle quer que ele a separe do seu irmão.

«Os Sonhadores» conta-nos a história da auto-descoberta de três estudantes que se testam uns aos outros para ver até onde conseguem ir, numa relação de emoções muito intensa, uma verdadeira iniciação, que tem lugar naqueles poucos dias em que se fecham numa casa durante o turbulento palco político da França na Primavera de 1968, quando a voz da juventude reverberava pela Europa. Quando saem dessa casa, já são crescidos, tornaram-se adultos. E a França também já não é a mesma. É a Primavera: a Primavera de Paris, a Primavera do seu despertar politico e a Primavera dos seus corpos. Não é um filme sobre o "Maio de 68", sobre as barricadas e as lutas na rua, mas sobre uma experiência. Inesquecível. E de algo irrepetível nas suas vidas.

"Havia uma grande esperança nos jovens que nunca antes fora vista, e que também nunca mais se veria. A tentativa de mergulhar no futuro e na liberdade foi fantástica. Foi a última vez que algo tão idealista e tão utópico aconteceu. (...) «Os Sonhadores» são um lembrete, como uma peça de música ou um raio de sol repentino. É um lembrete de um período em que uma geração inteira acordou pela manhã com expectativas incríveis. Talvez porque vejo os jovens de hoje melancólicos com o futuro, quero lembrá-los de um tempo em que o futuro era positivo.”

BERNARDO BERTOLUCCI


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